Dois elfos digladiam-se em meio a um vasto campo de batalha.
Movimentos rápidos e precisos. Saltos, piruetas...
Um voo rasante e o elfo mais velho acerta o outro que cai no
chão.
Sua recuperação é rápida e a ponta de uma flecha caída ao
seu lado serve de arma para uma investida feroz.
Punhos se trocam, se tocam e o cansaço diminui o ritmo da
batalha.
Em um momento decisivo o mais novo começa a rir,
desconcertando o outro.
-Por que faz isso, elfo?
-Eu não sei.
O elfo mais velho sai da posição de ataque e ambos pousam
sob um escudo enferrujado.
O sol do meio dia é impiedoso e distorce o solo arenoso.
O elfo mais novo se deita sobre o escudo:
-Sabe, eu realmente não entendo essa guerra...
-Qual delas? A deles ou a nossa?
-Tanto faz, a guerra... Eu não sei, não deveria nem estar
aqui.
-É fácil pra você falar, você não sabe como minha família é
rígida com essa história de guerras...
-É... mas, sabe, de alguma forma eu... entendo... que te
peguei desprevenido! Enquanto completava a frase jogou um punhado de poeira do
escudo contra os olhos do elfo mais velho iniciando novo ataque.
-Você joga sujo! Disse o elfo enquanto tentava se defender.
Por que você faz isso?
Enquanto desferia novos golpes, o elfo mais novo assumia uma
fisionomia lúdica, quase infantil. Seus olhos, muito redondos, brilhavam, e um
sorriso de malícia agora tomava conta de seu rosto.
Com um salto pra trás o mais velho pôde se proteger ao lado
de um elmo. Rapidamente sumiu por detrás da velha armadura e então reapareceu,
inesperadamente, acertando o outro elfo na cabeça.
-Isso doeu! Exclamou ele.
Enquanto isso, o elfo mais velho ia assumindo sua pose de
vitória e, como um sinal de sua nobreza, logo estendeu à mão ao parceiro de
combate. Este, por vez, recusou:
-Isso não é justo!
-O contra-ataque ou meu gesto de boa-fé?
-Tanto faz! Disse em tom jocoso. Por que você faz isso?
Nesse breve momento uma brisa passou por entre ambos e um
aroma de flores chegou ao íntimo de suas mentes.
-Você sentiu isso?
-Isso, o que?
-Isso, sente... Disse o elfo mais velho franzindo o nariz. São
girassóis, reconheceria em qualquer lugar.
O outro elfo se levantou e limpou as vestes há muito gastas
devido à luta. Suas asas começaram a bater rapidamente.
-Onde você vai? Exclamou o elfo mais velho. O aroma te suscitou
algo?
-Não é isso... Eu só, tenho que ir. Eu disse, não deveria
estar aqui... Suas pequenas asas acinzentadas se abriam e fechavam em um ritmo
hipnótico e o sorriso havia deixado seu rosto.
-Mas por quê? Retrucou novamente.
-Tenho muito a fazer... Neste momento seus olhos miravam o
horizonte e então prosseguiu: É inútil... E antes que me pergunte por que já
lhe respondo: É inútil porque uma luta cessa hoje e outra recomeça amanhã. Veja
todos estes corpos, seria esse nosso fim?
-Não, não é, não seria e não foi.
-Você fala do tempo como se pudesse entendê-lo.
-Acha que não entendo? Dessa vez eram as asas do elfo mais
velho que começavam a bater. Como uma mariposa, suas asas azuladas formavam um
desenho ao se abrir, talvez um rosto sorridente ou um mostro aterrorizante,
quem saberá dizer... E então voltavam a se fechar.
-Acho que você ficou tempo demais debaixo desse sol.
Respondeu.
Ambos estavam preparados para voar e o elfo mais velho perguntou:
-Você não gosta do calor do sol?
-Ele me cega, distorce o espaço e o tempo... O tempo... É
isso! Deu um sobressalto e seus olhos se arregalaram: Eu finalmente entendi o
porquê.
De súbito suas pernas impulsionaram o voo, deixando um
rastro acinzentado.
O elfo mais velho então gritou com a potência de quem tenta
alcançar a altura das nuvens apenas com a força dos pulmões: onde você vai?
-Há muito que eu tenho que fazer. Porém havia dito em voz
baixa, apenas para si, talvez não tivesse ar suficiente para projetar sua voz
até o solo.
Enquanto voava veloz, uma mancha azul anil era vista em meio
a uma de suas asas acinzentadas.